CFM Define Limites: Conselhos de Medicina Não Devem Protestar Débitos que já estão em Execução Judicial
  24 de Novembro de 2025

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O Conselho Federal de Medicina (CFM), por meio do Despacho SEI-N° 605, de 23 de setembro de 2025, emitiu uma orientação jurídica crucial que impacta diretamente a forma como os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) devem conduzir a cobrança de anuidades em atraso.

 

A decisão visa trazer segurança jurídica e coibir a duplicidade de cobrança excessivamente onerosa ao médico devedor.

 

O Cerne da Questão: A Cobrança Dupla

 

A consulta jurídica dirigida ao CFM tratava da viabilidade e legalidade do protesto cartorial de Certidões de Dívida Ativa (CDA) referentes a anuidades que já haviam sido ajuizadas em Ação de Execução Fiscal.

 

As anuidades dos Conselhos possuem natureza de tributo ("contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas"). Após a inscrição em Dívida Ativa, a cobrança pode ser feita por meio da Execução Fiscal ou pelo Protesto Extrajudicial da CDA, que é uma medida constitucional confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

 

O protesto extrajudicial é uma ferramenta válida e poderosa de cobrança administrativa, concebida para atuar como um instrumento de coerção indireta e tentar a quitação antes que se recorra à via judicial.

 

A dúvida central era se adotar simultaneamente a Execução Fiscal (via judicial, com potencial penhora de bens) e o Protesto (via extrajudicial, com restrição de crédito) para a mesma dívida configuraria um risco de abuso de execução ou de direito para a autarquia.

 

A Posição do CFM: Risco de Abuso de Direito

 

Embora o Despacho do CFM reconheça que não existe uma vedação legal expressa para a cumulação de cobranças, a Coordenação Jurídica concluiu que tal prática é não recomendável e de alto risco jurídico.

 

O argumento central para essa conclusão baseia-se em princípios fundamentais do ordenamento jurídico:

 

  1. Violação ao Princípio da Menor Onerosidade (Art. 805, CPC): Este princípio estabelece que, quando o credor puder promover a execução por vários meios, o juiz deve ordenar que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor. Ao optar pelo ajuizamento da Execução Fiscal, o Conselho já escolheu o meio mais enérgico, que permite a satisfação forçada do débito. Submeter o médico a ambos os gravames simultaneamente a possibilidade de bloqueio judicial e a restrição de crédito pelo cartóriopode ser interpretado como uma duplicidade de sanções para o mesmo objetivo.
  2. Abuso de Direito (Art. 187, CC): O Despacho indica que a utilização de múltiplos instrumentos de cobrança de forma simultânea e não escalonada pode configurar excesso. O protesto de um débito já judicializado contraria a lógica sequencial (primeiro esgotar a via administrativa/extrajudicial) e pode ser visto como uma tentativa de impor ao devedor uma pressão desproporcional.

O Risco Jurídico para os Conselhos

 

A jurisprudência sobre o tema não é uniforme nos Tribunais Regionais Federais. Contudo, uma corrente expressiva tem se alinhado aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, determinando o cancelamento do protesto quando a Execução Fiscal já foi ajuizada, por considerar a medida redundante e vexatória.

 

Ao adotar a prática de dupla cobrança, o Conselho se expõe a um risco jurídico concreto. O médico devedor pode ingressar com ação judicial pleiteando o cancelamento do protesto e, dependendo do caso, até mesmo indenização por danos morais, caso comprove prejuízos.

 

Os riscos incluem a condenação do Conselho em custas e honorários, além da necessidade de arcar com o ônus de demonstrar a legitimidade e a ausência de duplicidade na execução.

Orientação Final para a Cobrança

 

Diante da análise, a Coordenação Jurídica do CFM concluiu que o protesto extrajudicial de CDAs já em execução fiscal pode ser facilmente enquadrado como abuso de direito e violação ao princípio da menor onerosidade.

 

O CFM, portanto, recomenda aos Conselhos Regionais que adotem uma política de cobrança estritamente sequencial:

 

  1. Priorizar a satisfação do crédito por meios administrativos e extrajudiciais, incluindo o protesto da CDA, como primeira etapa.
  2. Ajuizar a Execução Fiscal apenas para os débitos que permanecerem inadimplentes após as tentativas extrajudiciais.
  3. Abster-se de levar a protesto os débitos que já se encontram em fase de execução fiscal, devendo prosseguir com a cobrança exclusivamente pela via judicial já eleita.

O Despacho reforça o direito do médico de não ser submetido a múltiplas e desnecessárias restrições de crédito para a cobrança da mesma dívida, uma vez que o processo judicial já em curso é o meio mais completo para garantir a satisfação do crédito tributário.

 

Paulo Leitão Advogados


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